Como avaliar e tratar a dor no ombro com a ajuda de um fisioterapeuta?
Já teve dores no ombro? Saiba como um fisioterapeuta o pode ajudar.
A prevalência de dor no ombro tem aumentado nos últimos anos, afetando mais de 20% da população em geral, sobretudo acima dos 50 anos. Embora a maioria das pessoas que sofrem de dor no ombro não procurem ajuda numa fase precoce, este é um dos principais motivos de procura pelos profissionais de reabilitação, mais especificamente os fisioterapeutas.
Apesar de existirem diversas patologias do ombro como “conflito subacromial”, “tendinite da coifa dos rotadores”, “bursite” e/ou “instabilidade anterior do ombro”, estes diagnósticos estão associados à presença de dor intensa. A dor ocorre devido a um distúrbio mecânico no espaço subacromial, geralmente acompanhada por uma restrição funcional (bloqueio), que impede a elevação do braço e/ou da mão acima, ou ao nível da cabeça e que também dificulta a realização de tarefas que exigem torção do ombro. Associado a este bloqueio pode existir uma sensação de instabilidade durante o movimento do braço que traduz a incapacidade de manter a cabeça do úmero no centro da cavidade glenoide, i.e. de manter a congruência articular.
Se pensarmos na progressão destas patologias, isto pode tornar-se bastante limitativo no dia a dia, dificultando a execução de algumas atividades essenciais como: pentear o cabelo, vestir ou despir uma camisola, tomar banho, fazer a higiene íntima, etc. Pode igualmente prejudicar o desempenho no trabalho, afetando tanto pessoas que trabalham muitas horas ao computador (no manuseamento do rato), que têm um trabalho continuado de escrita, ou que mantêm a postura do braço elevado durante longos períodos; àquelas que transportam pesos de forma repetitiva (mesmo que sejam cargas mais leves), ou que conduzem durante muitas horas. Esta problemática pode também afetar a performance de alguns gestos desportivos como o serviço no vólei ou no ténis, o passe e o remate no andebol, ou mesmo a prática de ginásio em exercícios como a elevação frontal com barra e push ups.
Estas patologias podem ser tão limitantes que se torna importante sensibilizar as pessoas sobre alguns sinais e sintomas que são comuns à maioria das condições dolorosas do ombro. As pessoas relatam frequentemente que numa fase inicial têm uma “sensação de peso” e/ou “desconforto” na região anterior do ombro ou na região do trapézio superior, a qual pode progredir para o cotovelo ou para o pescoço nas atividades que exigem um esforço maior. Este sintoma ocorre numa fase inicial do processo inflamatório, que mais tarde se irá traduzir em dor (cada vez mais intensa). Associado a este sintoma surge também a “sensação de fraqueza” quando solicitamos o uso do braço em atividades repetidas de elevação e/ou de torção (tal como foi referido nos exemplos anteriores), pela alteração dos padrões de recrutamento muscular (i.e. alteração da sequência correta de funcionamento dos músculos) e níveis de força entre os músculos que estabilizam o ombro e os que mobilizam o braço. Por fim, um dos principais sinais e talvez o que leva as pessoas a procurarem a nossa ajuda, é a redução das amplitudes do movimento do ombro - quantidade de movimento que a pessoa consegue realizar e do controlo neuromuscular do ombro - qualidade do movimento realizado (forma como realizamos determinada tarefa).
A avaliação e classificação destas patologias deve ser feita por um médico ou fisioterapeuta, visto a complexidade mecânica do ombro depender da dinâmica funcional de 4 articulações: acromioclavicular, esternoclavicular, glenoumeral e escapulotorácica; e da capacidade dos músculos associados (sobretudo a musculatura da omoplata) fornecer a estabilidade necessária a um movimento preciso. A consciencialização da dor e da limitação funcional por parte das pessoas nem sempre acontece numa fase inicial, tornado-se difícil corrigir o movimento, i.e. primeiro instala-se a disfunção do movimento e só mais tarde surge o sintoma associado - dor.
Qual o papel da fisioterapia?
A fisioterapia assume um papel fundamental não só na avaliação e diagnóstico, como no tratamento e prevenção da dor e da incapacidade associada ao ombro. Na avaliação clínica pode recorrer-se a diversos métodos: o mais importante, a observação clínica - cuja identificação e classificação das alterações do movimento dependem da capacidade de observação e manualidade do fisioterapeuta (ex: testes clínicos). Hoje em dia, já podemos recorrer a métodos de alta tecnologia - cuja precisão e rigor das medições depende essencialmente dos métodos e instrumentos utilizados (ex: sistemas de câmaras/optoelectrónicos, sistemas eletromagnéticos, etc.).
Relativamente ao tratamento, a literatura mais recente sugere que os protocolos de reabilitação devem incluir um plano de exercícios direcionados para a correção do movimento omoplata, tendo em conta um processo de (re)aprendizagem motora sequencial (3 fases: cognitiva, associativa e autónoma) e acompanhado, necessário para haver uma nova integração dos movimentos precisos da omoplata sobre o tórax. O sucesso dos resultados depende não só dos métodos de avaliação disponíveis e determinação de um plano de reabilitação eficaz, como também da identificação precoce dos sinais e sintomas anteriormente mencionados. Neste sentido é muito importante a capacidade de avaliação e diagnostico do técnico, seja médico ou fisioterapeuta que o acompanha, pois não interessa apenas resolver o processo doloroso, mas também tratar a disfunção do movimento de base para evitar recidivas da mesma lesão.
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